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Pós-deal: o que ocorre após uma aquisição?

Escrito por Leopoldo de Lima | Aug 8, 2023 3:00:00 AM

A grande maioria dos exits de startup ocorre via M&A. Em estudo (não tão recente) do Crunchbase (disponível aqui ) se observou que, num período de 5 anos, aproximadamente 97% dos exits de startups nos EUA ocorreram via aquisição, sendo os 3% restantes associados a movimentos de IPO. Adicionalmente, nota-se que mais de 90% das aquisições são de transações com valores inferiores a USD 100 milhões.  Fazendo um paralelo com o que se observa no Brasil, não há motivos para esperar que nossas estatísticas sejam muito divergentes daquelas apontadas no estudo do Crunchbase para os EUA. Na verdade, é razoável supor que a prevalência de M&As como rota de saída para startups no Brasil seja ainda maior, dada a escassez de IPOs de empresas de tecnologia no mercado local. Fatores como menor liquidez e maior custo de oportunidade do capital acabam impactando as alternativas de captação e rotas de saída para empresas de tecnologia ( matéria da Bloomberg ). 

Por outro lado, assim como nos EUA, o mercado de M&A brasileiro se concentra também em operações de menor valor financeiro. Como destacado em estudo da PwC, ainda no ano de 2020, cerca de 87% das transações que ocorreram no país eram inferiores a USD 100 milhões (estudo completo aqui ). Esse tema foi analisado em maior profundidade por Rafael Assunção em conteúdo disponibilizado em Maio, disponível aqui .

Nesse contexto, sabendo que o destino mais provável da jornada empreendedora é o M&A, não deixa de ser curioso que tantas dúvidas sobre o exit surjam somente quando se aproxima do momento da transação. Tendo isso em mente, o objetivo deste texto é trazer contribuições sobre como os fundadores podem se preparar para lidar melhor com o M&A e seus momentos subsequentes.   

Tenha consciência da estrutura da transação

 Os questionamentos acerca do que ocorre após a conclusão da transação possuem várias nuances que merecem ser observadas: como será a governança? Quem define os rumos estratégicos? Como serão os processos internos, tais como contratações, definição de fornecedores, etc? O que muda no que se refere às práticas contábeis? Como essas mudanças alteram a agilidade na condução do negócio? 

É possível desdobrar cada uma das dúvidas acima em diversas outras. Contudo, há uma única resposta que se encaixa em todas as perguntas: depende! Basicamente, o dia-a-dia do fundador dependerá tanto do tipo de transação que se está concluindo como também do perfil do comprador/consolidador. 

Sobre a estrutura da transação cabe observar que há alguns modelos possíveis, bem como combinações dessas variáveis. A figura abaixo ilustra os possíveis tipos de transação, diferentes relações de controle e possíveis fluxos monetários dessas combinações:  

Figura 1: possíveis estruturas de transação

  Sobre o tipo de transação, temos desde aquisição de participação minoritária até a aquisição de 100% das ações da startup. Quando não ocorre a aquisição de 100% no instante do fechamento da transação, há ainda a possibilidade de definição de acordo prévio sobre a opção de compra/venda das ações restantes, definindo assim o caminho para que o comprador detenha 100% das ações da startup ( path to control ).

Além disso, o fluxo monetário de uma aquisição pode gerar estruturas distintas, podendo ocorrer o pagamento em dinheiro para os sócios vendedores ( cash out ) ou uma combinação de pagamento para os sócios mais um investimento para reforçar o caixa da startup ( cash in ) para que ela execute determinado plano. Essas variáveis precisam ser bem compreendidas antes de avançar na venda da startup, pois  tendem a influenciar no quanto o comprador poderá interferir no dia-a-dia da gestão da companhia.

Na medida em que o comprador tem participação mais relevante, é razoável que ele tenha maior influência, até mesmo poder de votos afirmativos e/ou vetos sobre determinados assuntos como contratações, definição de fornecedores, definição de orçamentos, assinatura de contratos relevantes, etc. 

Outro aspecto relevante a ser compreendido pelo empreendedor acerca de como será sua rotina após a venda é como e quando o comprador pretende realizar a integração da startup adquirida. O processo de integração pode variar de comprador para comprador, bem como entre empresas adquiridas por um mesmo comprador e, conforme for este processo de integração, a empresa adquirida poderá ter mais ou menos liberdade para seguir com seus processos usuais. Sobre o tipo de transação, temos desde aquisição de participação minoritária até a aquisição de 100% das ações da startup.

Quando não ocorre a aquisição de 100% no instante do fechamento da transação, há ainda a possibilidade de definição de acordo prévio sobre a opção de compra/venda das ações restantes, definindo assim o caminho para que o comprador detenha 100% das ações da startup ( path to control ). Além disso, o fluxo monetário de uma aquisição pode gerar estruturas distintas, podendo ocorrer o pagamento em dinheiro para os sócios vendedores ( cash out ) ou uma combinação de pagamento para os sócios mais um investimento para reforçar o caixa da startup ( cash in ) para que ela execute determinado plano.

Essas variáveis precisam ser bem compreendidas antes de avançar na venda da startup, pois  tendem a influenciar no quanto o comprador poderá interferir no dia-a-dia da gestão da companhia. Na medida em que o comprador tem participação mais relevante, é razoável que ele tenha maior influência, até mesmo poder de votos afirmativos e/ou vetos sobre determinados assuntos como contratações, definição de fornecedores, definição de orçamentos, assinatura de contratos relevantes, etc. 

Outro aspecto relevante a ser compreendido pelo empreendedor acerca de como será sua rotina após a venda é como e quando o comprador pretende realizar a integração da startup adquirida. O processo de integração pode variar de comprador para comprador, bem como entre empresas adquiridas por um mesmo comprador e, conforme for este processo de integração, a empresa adquirida poderá ter mais ou menos liberdade para seguir com seus processos usuais.  

Figura 2: possíveis abordagens para integração de startup adquirida

 A figura acima resume algumas possíveis abordagens acerca da integração de startups adquiridas, conforme autonomia organizacional da startup após a transação e também a interdependência estratégica entre startup e comprador após o deal .  

Perfil do comprador

Compreendidos os pontos apresentados acima, convém ao empreendedor conhecer bem o perfil do comprador da startup: 

  • É provável que grandes corporações, com estrutura de governança mais rígidas, tenham preferência por processos de integração mais ágeis e incisivos, ficando entre os quadrantes de Simbiose e Absorção;

  • Há ainda compradores que são corporações investidas por VCs ou Private Equity ou até mesmo startups investidas por tais fundos que partem para aquisições. Nestes casos, é razoável que esse perfil de comprador ainda esteja priorizando o crescimento acelerado, tanto orgânico como inorgânico (por meio de mais aquisições), tendendo a se encaixar no quadrante de Preservação;

  • Por fim, há as holdings e SPACs, como temos visto mais recentemente. Esse perfil de comprador tende a postergar ou até mesmo não realizar uma integração, garantindo maior grau de liberdade para os fundadores/empreendedores de startups adquiridas. 

Além de conseguir categorizar o comprador, convém avaliar seu histórico de aquisições/integrações, sua governança e cultura organizacional. Todos esses aspectos poderão influenciar mais do que o grau de liberdade que o empreendedor terá, mas também como se dará o dia-a-dia após a transação.

Atenção especial à cultura da empresa adquirida deve ser dada, pois o alinhamento com a cultura e valores do empreendedor poderá tornar a rotina mais fluida após o M&A.  

Conheça seus futuros pares e superiores

 Uma das mudanças mais significativas para a rotina do empreendedor após a venda  é que, geralmente após a transação, ele não estará mais no comando da operação - ao menos não sozinho. É comum o empreendedor passar a ter de lidar com pares, muitos dos quais seguiram carreiras executivas e não tiveram experiência empreendedora, tendo cultura e vícios totalmente diferentes. 

Outras vezes, passam a ter de responder a superiores dentro da nova estrutura. Ainda que não existam superiores imediatos ou a figura de um chefe, os fundadores da startup precisarão invariavelmente reportar a um conselho de administração ou a um novo quadro de acionistas. Nesse contexto, convém fazer o dever de casa e conhecer quem são esses pares e superiores com quem precisarão lidar no dia seguinte da transação. 

Uma pergunta muito simples e direta ainda ao longo do processo negocial ajuda a esclarecer isso, além de reforçar a maturidade executiva dos empreendedores: quem serão meus pares e para quem eu devo reportar após a transação? Ao fazer esse questionamento o empreendedor força os compradores e buscarem essa definição antes do deal , caso ainda não o tenham feito.  

O tal do earn-out

A grande maioria das aquisições de startups possui o que chamamos de earn-out . Isso nada mais é do que um pagamento contingente, condicionado ao cumprimento de determinadas metas. O earn-out é mais frequente em transações onde parte considerável do valor da empresa alvo está no futuro, cenário comum para startups.  

A preocupação do empreendedor que avalia a venda de sua startup deve considerar:  

  •  A viabilidade das metas que são colocadas, sendo recomendável ao empreendedor evitar trabalhar com projeções excessivamente agressivas e se concentrar sempre em projeções da startup operando por si só - que chamamos modelo stand-alone.

  • Garantir que os meios para atingimento dessas metas estejam ao seu alcance: convém aos empreendedores garantir sua capacidade de executar o plano associado às metas de earn-out. O momento certo de fazer isso é durante as negociações do contrato de compra e venda, que deve conter cláusulas com previsão da autonomia necessária para executar o plano que foi vendido, além das condições de contorno caso essa autonomia seja prejudicada.

  • A incorporação de sinergias na definição de metas de earn-out também pode comprometer a viabilidade de execução do valor contingente. Certamente o comprador, quando adquire uma startup, avalia as potenciais sinergias que pode extrair do negócio. Contudo, é importante que o empreendedor visualize bem qual é o valor do negócio que ele está vendendo, o quanto está sob sua responsabilidade, e trabalhe para capturar este valor.

 Idealmente, eventuais metas associadas a sinergias de transação devem ser tratadas pelos vendedores como upside , justamente por haver pouca previsibilidade sobre o que eles podem fazer para atingir e superar aqueles resultados. 

Há diversos estudos que apontam para uma parcela grande das transações de M&A que falham em capturar sinergias mapeadas. Em estudo elaborado pela McKinsey em 2010 , se fala que algo em torno de 70% dos deals falharam na geração dessas sinergias. 

As implicações de um desenho de earn-out mal feito passam pelo desalinhamento de incentivos entre vendedores e compradores, e até mesmo a perda de motivação dos vendedores. Dificilmente empreendedores/executivos sem motivação permanecem no projeto por um período prolongado.   

Aspectos pessoais do fundador

 No final do dia, tudo se resume a pessoas. Com M&A não poderia ser diferente. Talvez por isso eu tenha me acostumado a sempre trazer nas conversas com empreendedores com quem trabalho sobre o porquê de eles montarem aquele negócio, como chegaram até ali e onde querem chegar. 

Mais do que compreender o lado pessoal do empreendedor, suas ambições e propósito, essas perguntas são fundamentais para entender um pouco melhor o lado humano por trás da indústria de empreendedorismo / venture capital, o que pode ter impactos significativos numa eventual transação de M&A. A depender dessas respostas é possível compreender, ainda que superficialmente, se um empreendedor terá fit com determinada cultura de uma corporação consolidadora, se há alinhamento de propósito, se ele se enxerga como parte daquela estrutura maior ou até mesmo se ele terá um bom encaixe no novo time e estrutura organizacional onde irá desembarcar após a transação. Todos esses pontos merecem ser bem mapeados. 

Outro ponto que merece destaque quando se fala de M&A de startups: é relativamente comum encontrar fundadores que tiveram pouca ou nenhuma experiência profissional fora do empreendedorismo. Isso pode afetar aquilo que eu costumo chamar de maturidade corporativa. Podemos ter um fundador que é excelente empreendedor e até mesmo ótimo executivo. Contudo, esse mesmo profissional pode ainda não possuir o “traquejo” para navegar no universo corporativo, compreender as diversas camadas de governança, processos, códigos formais e tácitos.

Por isso a importância de contar com a orientação de mentores ou conselheiros que tenham passado por essas experiências e que possam orientar esses fundadores  nesse processo.  

Considerações finais

 O processo de M&A é talvez um dos mais complexos da vida de um empreendedor. Como pôde ser visto ao longo deste artigo, são muitas variáveis em questão - e vão muito além de uma cifra financeira. 

A compreensão sobre a relevância dessas variáveis e seus impactos no longo prazo pode ajudar os vendedores a avaliarem melhor as alternativas que possuem diante de si no momento do M&A. Neste contexto, contar com o suporte externo de quem já vivenciou essa experiência tende a ter um valor nada desprezível.  

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